Nota do Editor: Esta matéria foi originalmente escrita em 2019, mas está sendo republicada hoje, em 2024.
Em 2019, foram registrados 34 casos de haitianos, ganeses, senegaleses, venezuelanos e marroquinos que vieram para morar em Tubarão. Com a crise, porém, as oportunidades diminuíram. O HC entrevistou uma família de imigrantes venezuelanos que compartilharam como foi a vinda e o acolhimento em Tubarão, além dos motivos que os levaram a sair do país.
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"Não tem combustível, não tem energia, não tem internet. Não tem transporte. Se pegar um ônibus, no meio do caminho você é atacado pela delinquência." Assim que Oliver Cortez, de 31 anos, ex-bombeiro do Corpo de Bombeiros de Maturin, Monagas, na Venezuela, descreve a situação atual do país de origem. Refugiado, ele chegou ao Brasil em abril de 2018 e mora em Tubarão desde abril de 2019. "A menos que o presidente saia para reconstruir o país, não tem como voltar."
Oliver é casado e pai de dois filhos. Pouco antes do nascimento do mais novo, Christopher José, ele nunca pensou que sairia da Venezuela. No entanto, com a morte do presidente Hugo Chávez e o cargo passado ao vice, Nicolás Maduro, a crise econômica do país - baseada na exportação de petróleo - se agravou. A queda do preço do produto afetou diretamente o PIB, tornando a vida no país insustentável. Sem dinheiro, o governo parou de comprar itens básicos do cotidiano da população.
"Subiu muito o preço da comida, não dava para manter uma família. Eu fazia meu trabalho, e meu salário não dava para manter o meu filho. Nessa época, minha esposa estava grávida. O salário que eu recebia dava para comprar um pacote de arroz, uma carteira de ovos e já ia todo." Oliver pediu demissão do trabalho e falou para a esposa, Ilma Amália, 24 anos, ficar em casa com as crianças. "Uma carteira de ovo num horário custava cinco, em outro horário custava seis, depois à noite custava dez." Resolveu sair de casa para procurar emprego no Brasil.
Quando o filho completou um mês de vida, Oliver atravessou a fronteira de Roraima com apenas dez reais no bolso. Segundo dados do ACNUR (Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados), entre 500 e 800 venezuelanos atravessam todos os dias para Boa Vista. Lá, Oliver trabalhava fazendo pequenos bicos. "Eu mostrava um currículo e eles jogavam no lixo só porque eu era refugiado. Fazia serviço, mas era explorado. A oportunidade de emprego me garantiu que Oliver começasse a mandar trezentos reais toda semana para a família, mas na Venezuela trezentos reais davam para comprar um pão", conta ele. Sob duras condições, com a família em casa passando fome, o senhor locatário se solidarizou com Oliver e emprestou dinheiro para uma passagem de avião até o Sul. Tubarão foi indicada para ele quando precisava de cinco mil reais para trazer sua mulher e depois os filhos, mas com o salário não dava.
O que ele não contava era com o acolhimento contraditório ao que havia presenciado no Norte do país. Ao conhecerem a história de Oliver, a comunidade do Sertão dos Correias, alguns voluntários da Cáritas, e mais o pessoal da empresa Metalfort se reuniram e conseguiram levantar um total de 4.600 reais, revertidos para pagar as passagens.
Ao sair da rodoviária de Tubarão, Oliver não tinha um tostão. Passou uma semana na rua, até que a instituição Beneficente Cáritas, que auxilia imigrantes, o acolheu numa casa do bairro Morrotes por 90 dias. O Padre Angelo Bússolo, que preside a Instituição, ajudou-o a reconstruir sua vida. "Eu era pego em casa e levado todos os dias para procurar emprego. Não foi fácil. Era muito não. Entregávamos currículos por toda parte, mas nenhum emprego aparecia."
Oliver, sua esposa e filhos se reencontraram no último mês, em agosto. Emocionado, o pai reviu o filho mais novo, já com um ano e meio, e o mais velho, Frederick José, já com três. A família completa vive hoje numa casa do Sertão dos Correias e agradece o acolhimento do povo do Sul. O caçula ainda não reconhece o pai, pois tinha um mês quando ele partiu. "Adaptação custa, tenho saudade de trabalhar na área da saúde. Minha esposa também é paramédica e ainda não trabalha. Ainda assim, não tem como agradecer."